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Indenização por lucros cessantes ao promitente comprador não é sempre presumida

A jurisprudência da 2ª Seção do STJ, firmada na sistemática dos recursos repetitivos, é de que “no caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma” (REsp n. 1.729.593/SP, relator ministro Marco Aurélio Bellizze, 2ª Seção, julgado em 25/9/2019, DJe 27/9/2019).


É importante esclarecer, no entanto, que o entendimento acima sedimentado é em casos que se trata de imóvel edificado e que há a manutenção do compromisso de compra e venda, ou seja, não é aplicável a todo e qualquer caso com inadimplemento da promitente vendedora, ainda que haja atraso na entrega do imóvel.


É necessário fazer essa ressalva pois os promitentes compradores, quando há inadimplemento da promitente vendedora, já presumem que é seu direito absoluto a indenização por lucros cessantes. E, muitas vezes, pelo fato de o promitente vendedor não ter uma defesa robusta, específica e técnica elaborada na ação judicial, a indenização acaba se concretizando; mas nem sempre essa indenização é realmente devida.


Explica-se


O que se defende neste artigo não é o afastamento total da indenização por lucros cessantes em benefício dos promitentes compradores, mas somente que essa indenização não é uma verdade absoluta e que em todo e qualquer caso com atraso na entrega do imóvel serão devidos os lucros cessantes. E é nesse sentido que se molda o entendimento do Superior Tribunal de Justiça.


No recente julgamento do AgInt no REsp 1.881.482-SP, ocorrido aos 6 de fevereiro de 2024, a 4ª Turma do STJ entendeu que “é indevido o pagamento de indenização por lucros cessantes, no caso de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel por inadimplemento da promitente vendedora”.


Ou seja, quando o promitente comprador, insatisfeito com o atraso na entrega do imóvel, postula a rescisão do contrato, cumulado com pedido de indenização por lucros cessantes, não se pode presumir o reconhecimento deste último pedido, uma vez que seu pedido principal é resilir o contrato, com o retorno ao estado anterior em que as partes estavam antes da contratação.


Ora, se a consequência da resilição do contrato é o retorno das partes ao estado anterior da contratação, o promitente comprador não deve receber nem mais nem menos do que forneceu, que será apenas o ressarcimento no valor necessário para colocá-lo na mesma situação em que estaria se o contrato não tivesse sido celebrado (chamado interesse contratual negativo).


Assim sendo, optando o promitente comprador pela resolução do compromisso de compra e venda, os lucros cessantes não serão presumidos e tampouco decorrentes de aluguéis da própria coisa. Até porque a devolução integral de todos os valores pagos, devidamente corrigidos e com juros, se acrescida de lucros cessantes, torna extremamente desproporcional a resolução do contrato, servindo até de incentivo ao promitente comprador para que assim proceda, multiplicando os conflitos e abarrotando o Poder Judiciário.


Subentende-se, dessarte, que a partir do momento em que o promitente comprador opta pela rescisão do contrato, ainda que seja sem sua culpa, mas pelo atraso na entrega da obra, com a restituição dos valores pagos devidamente corrigidos e o retorno das partes ao status quo ante, conclui-se que seus prejuízos materiais serão sanados pela devolução de toda a quantia paga com seus encargos legais, tornando indevida a indenização por lucros cessantes, ou ao menos a sua presunção, cabendo a ele provar o seu efetivo prejuízo.


Imóvel não edificado


Outra exceção da presunção dos lucros cessantes é quando se trata de imóvel não edificado, tanto que, em recente julgamento do AgInt no REsp 2.015.374-SP, ocorrido aos 2 de abril de 2024, a 4ª Turma do STJ entendeu que “no caso de descumprimento contratual decorrente do atraso na entrega de imóvel, os lucros cessantes não são presumíveis, pois dependem da finalidade do negócio, destinação ou qualidade do bem (edificado ou não), bem como da demonstração do prejuízo direto do adquirente”.


Ou seja, o STJ, especialmente a 4ª Turma, também entende que é inviável, via de regra, considerar que os lucros cessantes são presumíveis em toda e qualquer hipótese de inadimplemento do promitente vendedor. Há, ao menos, de se averiguar a finalidade do negócio, a destinação e a qualidade do bem adquirido, principalmente quando se trata de terreno não edificado, pois que, independente da sua destinação, seja residencial, comercial ou locatícia, presume-se, na verdade, que não seria de utilidade imediata, justamente por se tratar de um terreno sem construção.


Até porque, exceto casos muito específicos, não é comum o aluguel de imóveis não edificados. Se o terreno servisse ao propósito de edificação futura para implementação de moradia, negócio comercial ou locatícia, é fato que não ocorreria de imediato, pois levaria tempo considerável para sua construção.


Em todo caso, portanto, é importante se ter atenção, especialmente para realizar o necessário distinguishing em relação ao entendimento sedimentado em recurso repetitivo, que me parece ser muito claro e específico somente para os casos de descumprimento do prazo de entrega do bem edificado e em que há a manutenção do compromisso de compra e venda.


Os lucros cessantes, portanto, devem ser demonstrados e cotejados para representar aquilo que o promitente comprador efetivamente deixou de lucrar em razão do atraso da entrega do imóvel, já que, afinal, nos lucros cessantes é imprescindível que se tenha certeza da vantagem perdida.


Recomenda-se, portanto, tanto aos promitentes compradores quanto aos promitentes vendedores, especial atenção às peculiaridades de cada caso concreto, pois que os lucros cessantes não detêm presunção absoluta, ainda que haja atraso na entrega do imóvel.


Matheus Dias Maciel de Almeida Lima é advogado, sócio do GMPR Advogados, especializado em direito civil e processual civil e presidente da Comissão Especial de Direito Processual Civil da OAB/GO.

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