Recentemente, a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás (SEMAD/GO) publicou a Orientação Normativa 01/2024, que define novos parâmetros para a fixação das multas abertas, bem como para a aplicação de sanções em razão do descumprimento de condicionantes de licenças ambientais. A normativa trouxe parâmetros mais objetivos, antes inexistentes, a fim de auxiliar a dosimetria de multas abertas, que antes era um verdadeiro desafio para os fiscais ambientais, o que, muitas vezes, acabavam resultando em arbitrariedade e em critérios subjetivos.
Para tratar do conceito de multas abertas é preciso diferenciá-las das multas fechadas, ambas presentes no Decreto Federal 6.514/2008 e na legislação estadual. Diferente das multas fechadas, que tem por base um valor pré-fixado e critérios objetivos de aferição, como hectare, metro cúbico, etc; as multas abertas possuem um intervalo previsível e discricionário, a ser definido durante o ato de apuração da infração.
O artigo 66, Inciso II, traz a previsão da aplicação de multa aberta para quem deixa de atender a condicionantes estabelecidas nas licenças ambientais, por isso, é preciso atenção quanto a este tipo de infração.
Em razão da arbitrariedade e subjetividade que envolve a sua dosimetria, bem como da complexidade que envolve os atos de fiscalização e apuração da infração ambiental, a aplicação de sanções de multa em razão do descumprimento de condicionantes é um tema delicado, que demanda cautela por parte de empreendedores e consultores ambientais.
O primeiro aspecto que demanda atenção, que antes não estava claro na legislação, mas agora está previsto na ON 01/2024, é a necessidade de prévia notificação do autuado para, em tempo hábil, apresentar eventuais documentos, justificativas e complementações; bem como para sanar eventuais irregularidades do empreendimento. Sendo assim, com a nova normativa, caso ocorra a aplicação de multas em razão do descumprimento de condicionantes, sem que tenha sido oportunizada a apresentação de documentos e esclarecimentos, o auto de infração deverá ser considerado nulo pela autoridade ambiental.
Outro aspecto bem importante a ser analisado na aplicação de multas em razão de descumprimento de condicionantes é a aplicação de multas em razão do não atendimento de condicionantes genéricas e/ou orientativas.
Como é sabido, a maioria das licenças ambientais guardam como preâmbulo um arcabouço da legislação aplicável e de orientações genéricas ou apenas orientativas. Essas recomendações geralmente são intituladas de “condicionantes genéricas” e são inseridas em praticamente todas as licenças ambientais.
Antes da publicação da ON 01/2024, e de forma equivocada, muitos autos de infração estavam sendo lavrados por descumprimento de condicionantes genéricas e orientativas, que não guardavam relação alguma com o empreendimento licenciado ou mesmo trazia obrigações genéricas, como, por exemplo, “não realizar supressão de vegetação nativa sem autorização do órgão ambiental”. A partir de agora, com a nova normativa, não é possível a aplicação de multas por descumprimento dessas condicionantes genéricas.
Por fim, mas não menos importante, também é preciso destacar os novos parâmetros de dosimetria trazidos pela ON 01/2024, variáveis de acordo com o faturamento da empresa ou pessoa física, bem como dos indicadores de níveis de gravidade da conduta. Aqui, se faz um pequeno protesto com relação ao valor das multas e da possibilidade de aplicação de fator de multiplicação por cada condicionante não atendida.
Os novos parâmetros trazidos pela ON 01/2024, apesar de mais objetivos e racionais, trouxe a possiblidade de aplicação de multa que pode chegar ao montante de R$ 70.000,00 por cada condicionante descumprida, bem como a aplicação de fator de multiplicação pelo número de condicionantes descumpridas.
Este fator de multiplicação, inclusive, é passível de questionamento, já que o inciso II do artigo 66, do Decreto 6.514/2008, não trouxe essa possibilidade, já que a elementar do tipo traz a palavra “condicionantes”[1].
Assim, no momento de apuração da infração e de aplicação da multa, ao realizar a dosimetria da multa, deve-se considerar que ocorreu apenas uma conduta infracional, qual seja: deixar de atender a condicionantes estabelecidas na licença ambiental. Portanto, não há que se falar em fator de multiplicação, que se revela como verdadeira afronta aos princípios da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, princípios estes que a administração pública deve observar em todos os seus atos.
Essa opção de imputar multas exorbitantes e de forma desproporcional aos empreendimentos que buscaram a regularização ambiental por meio do licenciamento é penalizar quem está seguindo as regras e exigências ambientais, além de desencorajar aos que não buscaram ainda o licenciamento ambiental; já que o mesmo artigo que trata da ausência de licença é o que traz a previsão de aplicação de multa por descumprimento de condicionantes.
Conclui-se, portanto, que empreendedores e responsáveis técnicos devem ficar atentos quanto ao cumprimento dessas obrigações integradas às licenças ambientais, bem como ter atenção quanto à dosimetria aplicada pelo órgão ambiental ao receber multas por esse descumprimento. Sugere-se sempre a busca por um profissional especializado para auxiliar na análise do caso concreto.
Referências
[1] Art. 66. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar estabelecimentos, atividades, obras ou serviços utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, em desacordo com a licença obtida ou contrariando as normas legais e regulamentos pertinentes:
Multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais).
II – deixa de atender a condicionantes estabelecidas na licença ambiental. *Artur Siqueira é Advogado. Engenheiro Agrônomo, sócio do GMPR Advogados. Pós-graduado em Agrário eAmbiental pelo IBMEC-SP. Pós-graduando em Direito Processual Civil pelo IDP-Brasília. Coordenador do Núcleo de Agronegócio do Instituto de Estudos Avançados em Direito (IEAD). Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB-GO.
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