Os recursos repetitivos foram instituídos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) pela Lei n. 11.672/2008 e também são disciplinados pelo artigo 1.036 e seguintes do CPC[1], e têm como objetivo dar mais celeridade, isonomia e segurança jurídica no julgamento de recursos especiais que tratem da mesma controvérsia jurídica.
Ou seja, conforme definição do próprio Superior Tribunal de Justiça[2], é “o recurso julgado pela sistemática descrita no Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), em que o STJ define uma tese que deve ser aplicada aos processos em que discutida idêntica questão de direito”. O resultado do julgamento de um recurso repetitivo é, portanto, uma tese que possui caráter vinculante[3] e deve ser aplicada aos casos em que há discussão idêntica.
A questão, tratada neste breve artigo, é a seguinte: há alguma espécie de modulação dos efeitos do recurso repetitivo? Mais especificamente: a partir de quando e a quais casos são aplicáveis as teses firmadas?
A primeira hipótese é aquela mais simples e comum, quando o processo ou recurso está suspenso aguardando justamente o julgamento do recurso repetitivo no STJ. Nesses casos, após o julgamento, a tese será imediatamente aplicada àquele caso concreto ou o Magistrado deverá, para não o aplicar, fazer a distinção do caso com o recurso repetitivo.
A segunda hipótese é quando já há a modulação dos efeitos no próprio recurso repetitivo. Ou seja, ao julgarem e definirem uma tese de recurso repetitivo, os Ministros, preferencialmente naquele momento, definem a partir de quando e em quais casos são aplicáveis a referida tese.
E há uma terceira possibilidade: quando se decide pela desnecessidade de modulação dos efeitos, como ocorreu com o Tema Repetitivo 677 do STJ. Como fica a aplicação do repetitivo nessa hipótese?
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n. 1.604.515 – RS (2014/0170245-9), decidiu que o entendimento firmado em recurso especial repetitivo deve ser imediatamente aplicado, inclusive a casos que tramitavam antes de firmada a jurisprudência. Os Ministros ainda reconheceram que o novo Código de Processo Civil permite a modulação dos julgamentos neste tipo de recurso, exceto nas demandas em que a corte determina expressamente, no próprio repetitivo, qual limite temporal deve prevalecer, como na segunda hipótese acima descrita.
Sendo assim, parece-nos muito claro que, se na alteração do repetitivo não foi definida a modulação de seus efeitos, nos processos em curso e que ainda não transitaram em julgado, a tese do repetitivo é, sim, imediatamente aplicável, justamente conforme orientação do STJ no julgamento do Recurso Especial n. 1.604.515 – RS (2014/0170245-9) acima mencionado.
E, recentemente, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás confirmou a opinião acima, ao dar provimento ao recurso de apelação n. 5373793-28.2020.8.09.0051, oportunidade em que cassou sentença, que havia extinguido o feito por satisfação da obrigação e inaplicado o Tema 677 do STJ, pois que a penhora aconteceu antes de firmada a tese, e determinou o prosseguimento do feito quanto ao crédito remanescente, uma vez que a tese é, sim, imediatamente aplicável ao caso.
Somente naqueles casos em que já houve o trânsito em julgado ou que já há ato jurídico perfeito, entendemos que a tese do recurso repetitivo não deverá ser aplicada, pois que afetaria a segurança jurídica do país, sob pena de alterar-se resultados de julgamentos de décadas e séculos atrás.
Importante esclarecer, também, que não é necessário o trânsito em julgado da tese firmada em recurso repetitivo para a sua imediata aplicação. Ou seja, ainda que haja recurso contra o acórdão que alterou ou firmou o repetitivo, o Informativo 507 do STJ é muito claro ao dispor que “é desnecessário o trânsito em julgado da decisão proferida em recurso especial submetido ao rito do art. 543-C do CPC para a adoção da tese nele firmada. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.218.277- RS, DJe 13/12/2011; AgRg no REsp 1.095.152-RS, DJe 27/9/2010, e AgRg no AREsp 175.188-SC, DJe 22/8/2012. EDcl no AgRg no Ag 1.067.829- PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 9/10/2012”.
O acórdão proferido em sede de recurso repetitivo é, portanto, erga omnes, ex tunc e vinculante, pois que atinge aqueles processos ainda em curso e, conforme disposto no artigo 1.039 do CPC, a tese ali firmada deve ser imediatamente aplicada.
Conclui-se, dessarte, que são 03 (três) as hipóteses de aplicação da tese firmada em recurso repetitivo: (i) quando o processo ou recurso está suspenso aguardando justamente o julgamento do recurso repetitivo no STJ, sendo que nesses casos, após o julgamento, a tese será imediatamente aplicada àquele caso concreto ou o Magistrado deverá fazer a distinção do caso com o recurso repetitivo, ao inaplicá-lo; (ii) quando já há a modulação dos efeitos no próprio recurso repetitivo, qual deverá ser aplicada; e (iii) quando não há a modulação dos efeitos na tese do recurso repetitivo, a tese é imediatamente aplicável aos processos em curso em que não houve o trânsito em julgado e não há, ainda, ato jurídico perfeito, conforme definido no julgamento do Recurso Especial n. 1.604.515 – RS (2014/0170245-9), bem como no processo n. 5373793-28.2020.8.09.0051 pela Quarta Turma Julgadora da Quarta Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade.
*Matheus Dias Maciel de Almeida Lima é advogado, sócio do GMPR Advogados, especializado em direito civil e processual civil, coordenador da equipe cível do GMPR Advogados e Secretário-Geral Adjunto da Comissão Especial de Processo Civil da OAB/GO.
[1] Art. 1.036. Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e no do Superior Tribunal de Justiça. […]
[3] Art. 1.039. Decididos os recursos afetados, os órgãos colegiados declararão prejudicados os demais recursos versando sobre idêntica controvérsia ou os decidirão aplicando a tese firmada. […]
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