Por: Lúcio Flávio de Paiva
De onde se tirou a conclusão de que violar prerrogativa de advogado é conduta legítima não se sabe.
Imagine o leitor a seguinte situação: seu filho sai à noite para se divertir e por um algum motivo – que você desconhece – é preso. Cientificado do ocorrido, o leitor, claro, procurará o advogado de confiança para se inteirar do porquê da prisão e para conversar com o detido, saber o que se passou e se ele não foi vítima de algum abuso ou de maus-tratos físicos. O advogado vai, então, ao local em que se encontra o preso e, ao chegar, não consegue ter acesso ao auto de prisão e nem consegue se encontrar com aquele que está sob custódia, pois a autoridade responsável não permite.
Imagine, agora, outra situação: você contrata um advogado para defender seus direitos e entrega documentação sigilosa. Mas o escritório de seu advogado acaba sendo objeto de uma ordem de busca e apreensão decorrente de um processo que nada tem a ver com você, mas seus documentos também são apreendidos e agora se encontram em mãos de pessoas que em tese podem deles se utilizar em seu desfavor.
Essas situações hipotéticas – que infelizmente ocorrem com mais frequência do que se desejaria – envolvem duas das chamadas prerrogativas dos advogados: comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, quando estes se achem presos e a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho (artigo 7°, Lei 8.906/94).
Analisadas ambas as situações, concluirá o leitor que as prerrogativas não são, propriamente, direitos do advogado, mas sim garantias do próprio cidadão. Você, leitor, gostaria ou não de ter um advogado que pudesse atender imediatamente o ente querido preso? Gostaria ou não de um advogado cujo escritório pudesse salvaguardar, com segurança, documentos sensíveis e sigilosos?
Pois a Lei Federal 13.869/19, conhecida como Lei de Abuso de Autoridade, tipificava como crime a violação às prerrogativas da advocacia, o que representava notável avanço na defesa do cidadão contra o arbítrio estatal. Infelizmente, o presidente da República vetou o dispositivo: entre o polo fraco, o cidadão, e o forte, o Estado, o presidente escolheu proteger o último, sob a alegação de que o dispositivo causaria insegurança jurídica ao criminalizar condutas reputadas legítimas.
De onde se tirou a conclusão de que violar prerrogativa de advogado é conduta legítima não se sabe, mas o que merece destaque é que o veto enfraquece a atuação da advocacia e, por consequência, da defesa do cidadão e seus direitos. Resta a esperança de que o Congresso derrube esse veto e escolha proteger quem precisa: o povo, o verdadeiro dono da coisa pública.
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