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Nós precisamos achatar a curva das ações judiciais!

Por: Leonardo Honorato


Existe um alarmante cenário que não está tendo o devido destaque neste polarizado debate dos temas envoltos à pandemia: já está prenunciado o colapso do Poder Judiciário caso não se fomentem outras soluções que não o ajuizamento de ações judiciais! Vamos nos atentar aos indícios deste anúncio antecipado!


Em recente artigo [1], Bruno Daleffi, Julio Trecenti e Marcelo Guedes Nunes, nacionalmente conhecidos pelo trabalho de Jurimetria, compararam os números de novas ações judiciais no Estado de São Paulo nos meses imediatamente anteriores à quarentena.


De tais dados, chama a atenção o aumento em 20% no ajuizamento de ações judiciais na quinzena que imediatamente antecedeu o fechamento dos tribunais, indicando, já naquele momento, que o cenário de pandemia incitaria o maior volume de processos.


Na quinzena de fechamento, porém, houve uma esperada diminuição, seja pelo ineditismo da situação, cujas consequências ainda não se poderia prever, seja pela necessidade de “ficar em casa”.


Passada, no entanto, essa fase inicial de isolamento absoluto, ou, com mais razão, prolongado o isolamento por mais dias, dilatando, em igual proporção, os efeitos nefastos à economia, os números voltam a crescer de modo absolutamente preocupante.


Entre os dias 16 e 20 de março foram ajuizados mais de 180 pedidos de recuperação judicial só na capital do estado de São Paulo [2]. Se compararmos o número de recuperações judiciais no ano passado [3], 1.387, com a expectativa de pedidos neste ano, 2,5 mil [4], a preocupação é ainda mais reforçada.


O quadro, entrementes, vai além!


Se os números já alarmam no tocante à recuperação judicial, alarma maior haveria se conseguíssemos reunir tais dados relativamente ao número de ações em que, apoiando-se nos efeitos pandemia, pleiteia-se a suspensão de pagamentos, a revisão de obrigações e a resolução de contratos.


O CNJ até está louvavelmente tentando reunir tais informações, criando um Painel de ações relacionadas à Covid-19 [5], porém esse painel é alimentado voluntariamente pelos tribunais e pelas partes, de modo que ainda possui dados “subnotificados” (termo corriqueiro no cenário que vivemos).


Seja como for, são números igualmente assustadores e que nos levam a uma inevitável conclusão: também há que se achatar a curva das ações judiciais, sob pena de colapsar o Judiciário — o Hospital das Empresas, como alguns têm preciosamente o adjetivado — e disseminar a enfermidade empresarial!


Toda vez que uma empresa se enferma, é natural que ela se socorra perante o Poder Judiciário, seja para receber uma medicação mais branda — como uma ação judicial isolada, ou para uma internação em leito de UTI — pedido de recuperação judicial. Se um número descontrolado de empresas, porém, necessitar de medicação e de leitos de UTI, não precisa ser médico — ou jurista — para se presumir o caos que será instaurado!


Daí a necessidade de se pensar também no achatamento da curva de ações judiciais! É preciso se pensar em outros tratamentos! Mudar nossa cultura, sem temer que isso pese em nosso bolso (“órgão do corpo humano” mais sensível para alguns).


Não é momento de incentivarmos, irresponsavelmente, uma avalanche de ações judiciais desnecessárias (quando o forem, óbvio) se isso vai colapsar o sistema e aniquilar os suprimentos de todos, inclusive, ao final, de nossos próprios clientes.


É certo que as medidas públicas adotadas até então ainda não são suficientes para combater os efeitos econômicos da pandemia. As empresas — em sua maioria — vão adoecer, em menor ou maior grau. A empresa doente, por óbvio, procurará tratamento! E nós, advogados, devemos, sim, levá-la à internação, até mesmo, se for o caso, em leito de UTI, mas o façamos com responsabilidade!


É preciso, porém, que, antes, tentemos restringir o número de empresas em situações graves! Como? Aprimorando os tratamentos que temos e buscando outros novos!


As previsões existentes na legislação para revisão judicial de contratos e até mesmo de recuperação de empresas, não são suficientes para contornar a situação atual, de crise generalizada! A legislação que temos foi confeccionada para tratar crises de níveis menores que a atual, seja uma crise de um contrato isolado (teoria da imprevisão), seja para crise de uma empresa isolada com seus credores (recuperação judicial).


Não foi, no entanto, pensada para uma crise global e de todo o mercado, como a que vivemos. Afinal, como muito bem pontuado pelo amigo e brilhante advogado Lúcio Flávio Siqueira de Paiva [6], “a riqueza da vida não cabe na pobreza dos códigos”. Assim como neles não cabem as inevitáveis intempéries, como a atualmente vivida.


É preciso, então, desafogar o nosso hospital para que ele continue cuidando, com a precisão habitual, das moléstias mais graves. Indispensável, assim, que se fortaleçam as medidas extrajudiciais de resolução de conflitos — que já EXISTEM, não necessita ser a roda inventada — e o próprio pagamento das obrigações (circulando riquezas em momento em que isso é de tamanha valia!).


A maioria dos projetos até então apresentados, por mais bem intencionados e redigidos que sejam, encontra-se com olhares voltados a medidas que passam pelo Judiciário. Mais sensível ainda: estão circundando o instituto da moratória, com suspensão generalizada de pagamentos, quando talvez melhor seria fomentá-los!


Não que sejam propostas que não contenham pontos positivos, mas o momento exige que transcendamos!


O que é inquestionável, ou, ao menos, pouco refutado, é que a legislação que temos, não suporta a inédita crise que enfrentamos, de modo que, se todas as empresas se valerem dos tratamentos intensivos, corremos o risco de abarrotarmos nosso valoroso hospital!


É preciso, no entanto, que voltemos nossos olhos, criativamente, para tentarmos encontrar soluções que sejam baratas, rápidas e desjudicializadas, como tem defendido o professor Fábio Ulhoa Coelho, para que consigamos alcançar os pequenos negócios, com a celeridade que o momento exige e, ao mesmo tempo, achatando a curva das ações judiciais, preservando os hospitais das empresas.


Uma proposta com esses rótulos e que, se bem operacionalizada, pode servir de um bom tratamento, é a feita pelo próprio professor Fábio Ulhoa, na mesma linha que propôs Marcelo Guedes, de, por meio de medida provisória, estabelecer um procedimento declaratório, nas Juntas Comerciais, com parâmetros pré-estabelecidos de pagamento das dívidas, com fomento aos valores que sejam pagos nesse período inicial.


Ou mesmo que, enquanto em posições divergentes, colaboremos entre nós, advogados, lançando “mão de um terceiro advogado, um colega de confiança de ambos os profissionais, para realizar uma arbitragem — claro, com força decisória vinculante — que busque manter, de forma equânime e técnica, o equilíbrio do contrato e a recomposição de suas bases negociais”, como propôs Lúcio Flávio no já mencionado artigo que recentemente escreveu.


Seja como for, o importante é que nós, juristas, tenhamos a compreensão de nosso papel de defesa do Poder Judiciário como instrumento de defesa de nossos clientes, pensando, cada vez mais, em apenas levarmos aos hospitais as empresas que efetivamente necessitarem de tal socorro.


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