LGPD na prática: a importância de uma boa governança alinhada à administração de dados da sua empresa
- GMPR Advogados

- 24 de out.
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Em um mundo cada vez mais avançado e conectado ao digital, a proteção de dados tornou-se direito fundamental no Brasil. A Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD (Lei 13.709/2018) conferiu aos consumidores um conjunto claro de direitos (acesso, correção, portabilidade, eliminação, oposição e revisão de decisões automatizadas), impondo a controladores públicos e privados deveres de transparência, segurança e prestação de contas.
Imagine a seguinte cena: uma consumidora faz compras em uma loja e, dias depois, começa a receber ligações oferecendo diversos produtos. Ela nunca autorizou esse compartilhamento, mas seus dados circularam silenciosamente entre empresas. Essa história, que poderia acontecer com qualquer um de nós, mostra como o uso descuidado de informações pessoais gera insegurança, perda de confiança e até constrangimentos. É justamente para evitar episódios assim que a LGPD foi criada: para devolver às pessoas o controle sobre aquilo que lhes pertence, seus próprios dados.
Assim, após a LGPD, com a Emenda Constitucional 115/2022, a Constituição passou a assegurar, no art. 5º, LXXIX, o direito à proteção dos dados pessoais e a competência privativa da União para legislar sobre o tema. É um marco que reposiciona a privacidade como uma infraestrutura de cidadania e de mercado.
Esse desenho jurídico vale para ambos os mundos: o do cidadão diante do Estado (cadastros, políticas públicas, saúde, educação) e o do consumidor diante das empresas (e-commerce, fintechs, telecomunicações). A convergência é proposital: nos dois ambientes, o dado é veículo de direitos.
É verdade que, desde a entrada em vigor da LGPD, ainda há dificuldades práticas: pequenas empresas alegam falta de recursos, grandes empresas se perdem entre sigilo e transparência, e consumidores nem sempre sabem como exercer seus direitos. Mas os primeiros passos já apontam para uma mudança cultural. Hoje, quando ouvimos falar em vazamento de dados, já não vemos um problema “inevitável”, vemos uma falha que precisa ser explicada, comunicada e reparada.
Nesse sentido, a LGPD impôs uma série de obrigações para as empresas que lidam com dados pessoais, tornando essencial que essas organizações adaptem seus processos e práticas para garantir a conformidade com a legislação.
Todavia, ainda que a falta de recursos seja frequentemente apontada como um dos maiores desafios enfrentados por pequenas e médias empresas, ela não deve ser vista como um "bicho de sete cabeças".
Na maioria dos casos, o que dificulta a adequação à LGPD é a falta de informação clara e acessível sobre a legislação. Muitos empresários, diante da complexidade do tema, acabam percebendo a lei como algo mais desafiador do que realmente é. Isso pode levar ao adiamento de medidas simples e eficazes, que, se adotadas desde cedo, contribuiriam para prevenir problemas e garantir maior segurança jurídica – como explicaremos a seguir.
Investir em capacitação básica, seja por meio de cursos ou consultorias, pode reduzir significativamente os riscos e otimizar recursos. Ademais, conhecer a legislação permite que a empresa diferencie, por exemplo, situações em que é necessário proteger informações sigilosas daquelas em que deve prevalecer a transparência com o consumidor.
Esse equilíbrio evita tanto a omissão de informações, que pode ser interpretada como falta de boa-fé, quanto a divulgação indevida de dados.
Outro exemplo prático: imagine uma clínica médica que precisa fornecer aos pacientes acesso a seus prontuários. A transparência garante que o paciente possa exercer seu direito de acesso, mas o sigilo impede que esses dados sejam compartilhados com terceiros sem autorização. Saber exatamente onde começa e termina cada obrigação reduz falhas e previne autuações pela Agência Nacional de Proteção de Dados - ANPD.
A LGPD prevê uma série de penalidades para empresas que não se adequem às suas normas. A Lei estabelece, de forma didática, as principais sanções administrativas:
Advertência – aplicável em casos de infrações leves, com prazo para a empresa corrigir a irregularidade;
Multa simples – pode chegar a 2% do faturamento da empresa, limitada a R$ 50 milhões por infração;
Multa diária – aplicada enquanto a empresa não corrigir a irregularidade;
Publicização da infração – a ANPD pode determinar que a violação seja tornada pública, afetando a reputação da empresa;
Bloqueio ou eliminação de dados – em casos graves, a ANPD pode ordenar que dados pessoais sejam bloqueados ou excluídos, o que pode inviabilizar a operação de determinados serviços
Tais sanções, contudo, não se limitam à previsão da Lei. Dependendo do caso, a empresa pode ainda responder judicialmente, sobretudo se a violação causar danos à honra, imagem ou privacidade de um titular de dados, gerando pedidos de indenização.
Mais do que evitar multas, a prevenção deve ser encarada como estratégia empresarial. A implementação de políticas internas, treinamento de colaboradores e a nomeação de um encarregado de proteção de dados são medidas que demonstram comprometimento com a lei e aumentam a confiança do consumidor.
Empresas que tratam dados de forma organizada conseguem não apenas reduzir riscos, mas também utilizar as informações de maneira segura e estratégica, criando diferenciais competitivos no mercado.
A LGPD veio para transformar a cultura empresarial brasileira, colocando a proteção de dados como pilar central da relação entre empresas e consumidores.
Embora existam desafios, principalmente para pequenos negócios, o conhecimento da legislação é a chave para equilibrar sigilo e transparência, evitando falhas que possam resultar em multas e ações judiciais.
Em um mercado cada vez mais competitivo, a conformidade com a LGPD não deve ser vista como custo, mas como investimento na credibilidade e na sustentabilidade do negócio. Tanto consumidores quanto empresários têm um papel ativo na construção de um ambiente digital mais seguro e confiável.
Diante do exposto, buscar assessoria especializada é essencial para empresas que enfrentam autuações ou têm dúvidas sobre a LGPD. O apoio de um advogado pode orientar na regularização, evitar multas e ações judiciais e estruturar um plano de adequação contínua.
Em um cenário onde os dados são ativos valiosos, prevenir riscos é mais econômico e seguro do que corrigir falhas, garantindo proteção e confiança nas relações comerciais e digitais.
Artigo publicado no Rota Jurídica e escrito pelos advogados Ingrid Tainá Gomes e Pablo Augusto Araújo Cunha.
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