Ao contratar o seguro de vida, o segurado anseia por segurança financeira e amparo à família, resguardando-se da possibilidade de eventual infortúnio. Entretanto, infelizmente, nem sempre quando o sinistro acontece, de fato, o segurado e/ou os beneficiários são indenizados, frustrando-se a expectativa do contrato.
Por vezes, isso acontece com base em negativas indevidas por parte das seguradoras, que se esquivam do dever de indenizar, alegando motivos insuficientes para afastar o direito do segurado.
Neste breve artigo, serão tratadas as 3 (três) principais negativas indevidas do seguro de vida, com base no entendimento da jurisprudência do STJ, de modo que, ao final, você (segurado ou beneficiário) terá ciência de seus direitos ao ter o seguro negado indevidamente.
1) Doença preexistente não informada no momento da contratação
É dever de todo contratante agir de boa-fé e prestar declarações verdadeiras (art. 765, do CC[1]). Um dos argumentos que as seguradoras utilizam para negar o seguro de vida é, justamente, a existência de doença preexistente não informada no momento da contratação do seguro. Essa conclusão é amparada pelo artigo 766 do CC[2].
Contudo, corriqueiramente, o segurado não tem ciência da doença e, por essa razão, não informa à seguradora. Nessa situação, a referida negativa torna-se ilícita, sobretudo porque o segurado não agiu de má-fé e não pode ser prejudicado por falha no dever de cautela da seguradora, já que o risco é inerente à própria atividade empresarial. Esse entendimento é consolidado na Jurisprudência e, inclusive, sumulado pelo STJ (Súmula 609[3]).
Portanto, para validar a negativa com base em doença preexistente não informada no momento da contratação do seguro, compete à seguradora exigir exames prévios à contratação ou demonstrar que o segurado agiu de má-fé. Do contrário, a negativa pode ser revertida judicialmente por ser ilícita, conforme entendimento do STJ.
2) Agravamento de risco
“O segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato” – é a redação do artigo 768 do CC. Em complemento, a doutrina explica que o agravamento de risco significa “aumentar a probabilidade de ocorrência de um evento que, em princípio, estava garantido pelo contrato de seguro”[4]. Aí está, portanto, o conceito de agravamento de risco.
Nada obstante, o STJ entende que a exclusão de coberturas nos seguros de vida deve ser interpretada restritivamente, para não esvaziar a própria finalidade do contrato, uma vez que é “da essência do seguro de vida um permanente e contínuo agravamento do risco segurado” (REsp 1.665.701/RS, Terceira Turma, DJe 31/05/2017).
Na mesma esteira, assentou-se que “a cobertura do contrato de seguro de vida deve abranger os casos de sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelo segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas, ressalvado o suicídio ocorrido dentro dos dois primeiros anos do contrato” (EREsp 973.725/SP, Relator Ministro LÁZARO GUIMARÃES).
Partindo desses preceitos, entende-se que a discussão sobre um suposto agravamento de risco pelo segurado no contrato de seguro de vida é frequentemente superada, devendo-se conceder a indenização quando evidenciado o sinistro, o nexo de causalidade e o óbito do segurado.
Nos casos em que não resulte a morte do segurado, como na invalidez permanente, por exemplo, a negativa só é válida se o fator determinante para a ocorrência do sinistro for, necessariamente, a circunstância agravante. Ou seja, se o segurado sofreu um acidente de carro e a seguradora negou a indenização porque ele não estava habilitado para dirigir, mas essa não foi a causa do acidente, a negativa é indevida, conforme a jurisprudência do STJ[5].
Assim, pode-se dizer que, no que se refere ao seguro de vida, em muitos casos, a negativa decorrente de um suposto agravamento de risco pode ser reformada judicialmente, pois pode ser considerada abusiva e inválida.
3) Ausência ou atraso de pagamento do prêmio
A nomenclatura “prêmio” pode dificultar, um pouco, a compreensão do significado do termo, pois sugere ser a indenização do seguro, quando, na verdade, refere-se à quantia paga pelo segurado à seguradora para ter acesso às coberturas da apólice. Em outras palavras, prêmio é o valor pago para estar segurado.
A ausência de pagamento do prêmio, por óbvio, configura inadimplência contratual e resulta na mora do segurado, cuja consequência é a perda do direito à indenização se o sinistro ocorrer antes de sua purgação (art. 763, do CC[6]).
Para isso, no entanto, segundo o entendimento sumulado pelo STJ (Súmula 616)[7], faz-se necessária a prévia notificação específica do segurado para a sua constituição em mora, haja vista que o simples atraso no pagamento da prestação mensal não produz o cancelamento automático ou a imediata suspensão do contrato de seguro.
É dizer: a negativa do seguro de vida por ausência ou atraso de pagamento do prêmio pode ser revisada judicialmente, se não houver prévia notificação de constituição em mora do segurado.
Essas são, portanto, as 3 (três) principais negativas do seguro de vida que, segundo o entendimento do STJ, são inválidas e passíveis de serem revistas.
Por tudo isso, mostra-se prudente a ideia de que cada caso concreto deve ser analisado de forma pormenorizada, de preferência com o auxílio de um corpo jurídico técnico especializado na área, que conheça o entendimento do Tribunal Superior e saiba aplicá-lo na prática, a fim de garantir o direito do segurado ou beneficiário.
*Igor Gomes dos Santos é advogado no GMPR Advogados.
[1]Art. 765. O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato, a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.
[2]Art. 766. Se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do prêmio, perderá o direito à garantia, além de ficar obrigado ao prêmio vencido.
Parágrafo único. Se a inexatidão ou omissão nas declarações não resultar de má-fé do segurado, o segurador terá direito a resolver o contrato, ou a cobrar, mesmo após o sinistro, a diferença do prêmio.
[3]Súmula 609 do STJ: A recusa de cobertura securitária sob alegação de doença preexistente é ilícita se não houve a exigência de exames prévios à contratação ou a demonstração de má-fé do segurado.
[4]COMPOY, Adilson José. (Contrato de seguro de vida [livro eletrônico]. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014);
[5]“a ausência de habilitação para dirigir não configura, por si só, o agravamento intencional do risco por parte do segurado, apto a afastar a obrigação de indenizar da seguradora” (AgInt nos EDcl no AREsp 1.301.702/PR, Quarta Turma, DJe 29/10/2018; AgRg no AREsp 218.061/MG, Quarta Turma, DJe 4/2/2014 e AgInt no AREsp 990.103/MT, Terceira Turma, DJe 9/2/2017).
[6]Art. 763. Não terá direito a indenização o segurado que estiver em mora no pagamento do prêmio, se ocorrer o sinistro antes de sua purgação.
[7]Súmula 616 do STJ: A indenização securitária é devida quando ausente a comunicação prévia do segurado acerca do atraso no pagamento do prêmio, por constituir requisito essencial para a suspensão ou resolução do contrato de seguro.
Comments