Sou obrigado a ceder passagem para o meu vizinho captar água que corre em minha propriedade?
No meio rural, é bastante comum que dois produtores rurais, seja por conveniência ou por uma negociação prévia, acabem por acordar em permitir a captação e passagem de água por meio de canais de uma propriedade a outra. Essa prévia autorização, em casos especiais, poderá ensejar, inclusive, o que chamamos de direito de servidão de passagem.
O questionamento feito por vários produtores é: em qualquer circunstância, sou obrigado a ceder passagem para o meu vizinho captar água que corre em minha propriedade?
De início, sobre o tema, tem-se que os cursos d’água em propriedades rurais podem ser tanto de propriedade pública como particular, conforme definições trazidas pelo Código de Águas, legislação específica que regula sua utilização. São particulares as nascentes e todas as águas situadas em terrenos que também o sejam, quando não forem classificadas entre as águas comuns de todos, as águas públicas ou as águas comuns.
Para sua utilização na atividade rural, como para a irrigação de culturas, por exemplo, é indispensável a existência da autorização do ente público, por meio da portaria de outorga de uso de água, legalizando a captação.
Uma vez regularizado o requisito da outorga para utilização da água, é possível também a captação deste recurso em propriedade vizinha, através de estrutura denominada aqueduto, e desde que preenchidos, obrigatoriamente, alguns requisitos impostos pela legislação.
O primeiro requisito para permitir essa captação de água em propriedade alheia é a prévia e justa indenização ao proprietário da área em que o corpo hídrico se encontra. Desde que tenha sido acordado entre os proprietários vizinhos e devidamente acertada a indenização entre as partes é possível afirmar que o primeiro requisito está cumprido. Essa determinação está prevista no artigo 1.286 do Código Civil e é caracterizada como uma servidão de passagem.
Prevê o artigo 1.286 do Código Civil que, mediante recebimento de indenização que atenda, também, à desvalorização da área remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem, através de seu imóvel, de cabos, tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade pública, em proveito de proprietários vizinhos, quando de outro modo for impossível ou excessivamente onerosa.
Isso significa que, mediante indenização prévia, pode o proprietário, por meio de aquedutos, realizar a captação de água na propriedade vizinha, desde que respeitados os direitos do proprietário da área pela qual será instituída esta servidão de passagem, tais como: direito de exigir obras de segurança para a captação; realizar a captação de modo menos gravoso e de menor prejuízo ao proprietário da área.
Por outro lado, nota-se que o segundo requisito imposto pelo artigo 1.286 é a necessidade de comprovação da impossibilidade de acesso a outra fonte de captação ou, alternativamente, quando tornar excessivamente onerosa essa alternativa para a captação em outro ponto.
Em outras palavras, é preciso que o vizinho não tenha alternativa técnica para a captação de água, bem como que esta alternativa seja excessivamente onerosa a ponto de inviabilizar o projeto.
Logo, se provado que há outra fonte hábil para captação de água, não há que se falar em obrigatoriedade de aceitação pelo proprietário da terra que um vizinho faça a captação em manancial de sua propriedade, pois trata-se mera utilidade.
Conclui-se, portanto, que não são todos os casos em que o proprietário é obrigado a permitir a captação e passagem de água pelo proprietário vizinho, devendo atentar-se ao preenchimento simultâneo dos requisitos impostos na legislação, bem como, por óbvio, exigir a obtenção prévia da regularização do uso de água por meio da portaria de outorga.
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