Matéria muito debatida e controvertida nos tribunais brasileiros, a possibilidade ou não de cobrança extrajudicial de dívida reconhecidamente prescrita foi recentemente analisada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Para mais fácil compreensão do leitor, antes de informar o julgamento do STJ sobre a matéria, se faz necessário esclarecer que, ao contrário do que a maioria da população pensa, o que prescreve, a teor do que dispõe o artigo 189 do Código Civil, é a pretensão do direito, não o direito em si. Ou seja, o direito do titular permanece intacto e válido, mas não pode ser por ele exercido.
Um exemplo prático, para mais fácil compreensão: o credor de um instrumento particular não cobra a dívida no prazo de 05 anos, previsto no artigo 206, §5º, I, do Código Civil, oportunidade em que o devedor propõe ação declaratória de inexigibilidade de débito e reconhecimento de prescrição, que é provida, ou seja, declara-se que o débito é inexigível e que a pretensão de cobrança da dívida prescreveu. Com esse julgamento, a dívida deixa de existir? A resposta é não! Isso porque, embora o credor não possa cobrar a dívida, não quer dizer que ela deixou de existir ou desapareceu. A dívida só não pode mais ser cobrada, mas acaso o devedor queira, pode realizar o pagamento por livre e espontânea vontade.
E é agora que entra o julgamento do STJ, pois, que a dívida que teve reconhecimento de prescrição não pode ser cobrada judicialmente, já sabemos; mas, e extrajudicialmente? Pode? De acordo com o recente julgado do STJ, não pode! Ao julgar o REsp 2.088.100, em outubro de 2023, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o reconhecimento da prescrição da pretensão de cobrança da dívida impede a cobrança judicial e extrajudicial do débito.
A Ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, ainda destacou que ao cobrar, ainda que extrajudicialmente, o credor está, sim, exercendo sua pretensão, mas fora do processo: “se a pretensão é o poder de exigir o cumprimento da prestação, uma vez paralisada a sua eficácia em razão do transcurso do prazo prescricional, não será mais possível exigir o referido comportamento, ou seja, não será mais possível cobrar do devedor a dívida. Isto é, encoberta a pretensão pela exceção de prescrição, estará o credor impossibilitado de cobrar o débito do devedor, seja judicial, seja extrajudicialmente.”
Em decisão mais recente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) mais uma vez reiterou esse entendimento, por meio do julgamento do AREsp 2.447.325, oportunidade em que o Ministro Humberto Martins, monocraticamente e com fundamento no trecho acima transcrito da Ministra Nancy Andrighi, determinou que uma empresa “se abstenha de realizar cobranças judiciais ou extrajudiciais da referida dívida, com exclusão do nome da recorrente dos órgãos de proteção ao crédito”.
O entendimento atual, portanto, é que, se houve o reconhecimento de prescrição da pretensão de cobrança da dívida, o credor não pode, judicial ou extrajudicialmente, exercer a pretensão de cobrança da dívida.
Conclui-se, dessarte, que é ilícita a cobrança, ainda que extrajudicial, de dívida prescrita, o que deve ser observado pelos credores, pois, além de não receber o valor da dívida, ainda pode ocasionar sua condenação ao pagamento de eventuais honorários de sucumbência.
*Matheus Dias Maciel de Almeida Lima é advogado, sócio do GMPR Advogados, especializado em direito civil e processual civil, atuante em direito imobiliário e civil, coordenador da equipe cível do GMPR Advogados e presidente da Comissão Especial de Direito Processual Civil da OAB/GO.
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